Voa Voa

... que o tio agora namora Lisboa.

quinta-feira, janeiro 08, 2009

Dias de manhãs vazias

Dias de manhãs vazias
tardes que se arrastam alarves
nenhum crime perfeito pra cometer
não penses, faz
chefia o teu sôfrego querer
gira em torno do teu saber
não penses, faz
entretem o teu ser
verás que o final satisfaz
e logo podes sentir a presença d'alguém
pensa e abraça a recompensa
tu sabes quem
já ouves as suas cigarras
e todos os encantos que ela tem
é o momento de mostrar as tuas doces garras
acasalar enquanto a noite se desfaz
agora não penses, fuma o cachimbo da paz

terça-feira, janeiro 06, 2009

Anseio

Anseio
apenas um devaneio
um elo imaginário
pensamentos entornados
tostões furados
na caixinha do santuário
Acho que perdi as forças
pra sair dos meus chinelos
fico a ver passar as corças
ao parar nos amarelos
Porque encontrei um sítio
um parque na floresta
lá se vegeta o espírito
a couraça faz uma sesta
Quanto duraria este sonho
todos os dias...acordo a tentar descobrir
que tu também não o sabias...num duelo de balas a sentir
também eu me envergonho
Mas a vida parece que não chega
quando me deixa sem destino, sem um fim
gasto o tempo à procura dum perdão em mim
e anseio
por um toque de recreio
é tempo de adiar mais uma entrega

domingo, janeiro 04, 2009

Toda a meia-estação

Toda a meia-estação
agora com nova fórmula
as folhas velhas no chão
e viva a revificação
saúde à vida póstuma
A todo o meio gás
armo disparos de foguetão e passeios de balão
a frente fria
acorda e arrepia
tudo o que vem de trás
Agora passa uma brisa amena
abrigo os olhos pra poder ver
no quarto escuro uma pequena
cujo sopro é o seu dizer
Na rua os espelhos feitos de chuva querem mexer
quem a pisa, não repara neles pra se rever
a mim apetece um que seja profundo
ser só cair e sumir
ir dentro do meu mundo
onde o inverno perde o rigor
é que desde que deu o teu sol
no meu coração mole
bate-bate e reina o calor

Essa fumaça verde

Essa fumaça verde
dum transparente cego
fumo que se come
bosque que se perde
clareira que não nego
Fica o cheiro
já está longe demais
é preciso um mensageiro
pra me levar os postais
Um sinal por dia
de fumo e alegria
assim se desalma
sente-se uma calma
A espera de continuares a arder
atrasa, mata a vida um bocadinho
só ao fim de a escrever
si tia, ao fim do dia
cai a neve devagarinho...

quinta-feira, janeiro 01, 2009

Quando a poesia bate à porta

Quando a poesia bate à porta
é um ter qu'ir atender
é um ter qu'ir escrever
e a solidão é morta
Flui, flui
quando me dou conta já fui
cumprimentei-me e entrei
bebi e deitei
bebi e sonhei
até trincar a fava
eu que sonhava
que nunca mais acordava
Eras um bolo-rainha
em terra de azevias
de batatinhas com enguias
de uvas sem graínha
não há espaço para todos
mas começas a comer
e lá se foram os modos
mas onde é que os ponho?
ah, não esquecer
guardar no bolso um sonho...

esqueci-me de vos dizer, a joaninha levantou vôo e foi pousar noutro mundo...se as pintinhas sorrissem...
há uma previsão inevitável a fazer: vai haver mais poesia, mais poesia ao ar livre

a treta d'ontem pode ficar a mofar:
levanta-se um demónio de saiote =» arqueia-se o diabo do coiote =» nunca a vida foi tão sofrida e preferida =» hoje é o tempo duma velha e pequena futura gigante romper a cápsula da sua frágil quimera volante =» brota, rebenta, esgota mas tenta =» e um dia farás sombra às manhãs que não passaram da penumbra

Há grão que anda sempre comigo

Há grão que anda sempre comigo
de areia ou de xerem
sabor a sal antigo
tempêro da água-mãe
A alma sossega-se a flutuar
a palmeira abana com calmeira
a onda deita-se redonda
no corpo liquído do mar
Todo o dia me geminas mais um pouco
me dás força de nidificar
vou sentindo o que é ser louco
por não ter quem me segurar
tomo um caneco de memórias
lembro do bom, do melo
até virar verde com as escórias
e desembarcar no meu porto do Mindelo
Porque me fascina o irrepetível?
será o gosto pela saudade do inesquecível?
ela que me vá afiando o gume
que não deixe morrer o lume
mas ouve, não é ninguém
vai-se o vai e vem-se o vem
e do esconderijo sai esquivo
um outro nado-vivo